Arqueologia, Memória e História Indígena – Programação


Programação

(em atualização)


Programação do Simpósio
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No simpósio “Arqueologia, Memória e História Indígena” serão realizadas três conferências e quatro mesas-redondas.


› Conferências 


Arqueologia e Memória Cultural no Alto Xingu: Reflexões em Duas Décadas de Colaboração

Prof. Dr. Michael Heckenberger 

University of Florida

Esta conferência reflete duas décadas de pesquisa conduzida entre a comunidade ameríndia Kuikuro do Xingu. O Alto Xingu é um dos casos mais conhecidos de sociedades sócio-politicamente complexas na Amazônia pré-colombiana, “garden cities” do sul da amazônia. É também um claro exemplo de continuidade cultural in situ entre estas polities antigas e populações indígenas contemporâneas. Portanto, consiste em um caso único para considerarmos a história indígena e as paisagens culturais na região, assim como a articulação entre a popuação indígena e a produção do conhecimento científico. Discutirei as mudanças nas abordagens da arqueologia e da história indígena nas últimas duas décadas, incluindo o envolvimento e interesse das comunidades locais e colaborações entre arqueólogos, linguistas, etnografos e ecologistas. Finalmente, este paper reflete sobre como a arqueologia articula com a crescente preocupação relativa aos direitos culturais das populacões indígenas frente ao desenvolvimento e mudança climática no “arco do desmatamento”.


O que tão alternativas são as arqueologias alternativas?

Prof. Dr. Cristobal Gnecco

Universidad del Cauca, Pesquisador Visitante CNPq – Universidade Federal do Rio Grande do Sul

As arqueologias alternativas poderiam ser descritas como afastadas dos mais importantes princípios disciplinares. Elas poderiam até mesmo ser vistas como um desafio à hegemonia desfrutada pela arqueologia por tanto tempo, uma dominação construída por um consentimento hoje despedaçado. As perspectivas feministas e indígenas têm sido destacadas como as propostas dissidentes mais relevantes dentro da disciplina, rotuladas como arqueologias alternativas quando totalmente desenvolvidas em programas por conta própria. Será que elas realmente afastarem da arqueologia dominante, desafiando a sua dominação? Elas são realmente alternativas? Uma maneira de esboçar uma resposta é avaliando a sua perspectiva metafísica e ontológica. Ao fazer isso, é possível ver que mais freqüentemente do que não arqueologias alternativas reter os princípios modernos da prática disciplinar.


O Plural das Arqueologias Indígenas

 Prof.ª Dr.ª Fabíola Andréa da Silva

Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE/USP) 

A crítica pós-colonialista teve um profundo impacto sobre o debate teórico-metodológico da Arqueologia: 1) provocou uma revisão da história da disciplina e a proposta de redefinição de suas práticas a partir de uma ética não-colonialista; 2) obrigou os arqueólogos a reconhecerem que o seu trabalho não é realizado em um vácuo social e cultural, mas dentro de um campo de relações de poder e de interesses diversos (políticos, econômicos, sociais e culturais); 3) gerou a necessidade de relativizar o foco do trabalho arqueológico, ou seja, de não considerar apenas o registro arqueológico em si, mas também, o contexto sócio-cultural onde ele se insere e onde se desenvolve a pesquisa; 4) desencadeou uma reflexão sobre o papel social do arqueólogo e a reconsideração do modo como os arqueólogos representam e interpretam o passado, ressaltando a necessidade de incorporar as epistemologias nativas na construção deste conhecimento. Neste contexto as “arqueologias indígenas”, nas suas mais diferentes expressões, ganharam um grande destaque, emergindo como uma crítica ao pensamento arqueológico ocidental. Ela são realizadas “com, para e/ou pelos” povos indígenas, sendo que a pesquisa está direcionada para a produção de conhecimento para e pelos indígenas e não apenas sobre estes povos. Essas “arqueologias indígenas”, no entanto, não pressupõem a harmonização dos interesses dos indígenas e da comunidade científica e reflexões são feitas sobre os problemas e as possibilidades de se construir narrativas sobre o passado a partir de uma perspectiva alternativa, dialógica e reflexiva de produção do conhecimento sobre o registro arqueológico. Essas experiências desafiam a arqueologia e propiciam um valioso material para o debate sobre a gestão do patrimônio arqueológico.


› Mesas-Redondas


O Simpósio proporcionará o desenvolvimento de discussões em mesas-redondas com foco em quatro eixos temáticos:


1.Memórias locais e academia

Este eixo temático visa trazer a problemática da construção do conhecimento por vezes conflitantes entre acadêmicos e populações tradicionais, enfocando nas experiências de projetos de pesquisa colaborativos e na construção de discursos multivocais.

Palestras:


Entrando na Agora: Arqueologia, Colaboração e Ciência na Amazônia

Prof. Dr. Michael Heckenberger

University of Florida

Este paper advoga estratégias contextualmente sensíveis à produção acadêmica do conhecimento que promovem o engajamento entre pesquisadores científicos dentro dos vários contextos disciplinares, vistos mais como técnicos hábeis do que peritos, e entre acadêmicos e o público diverso, notavelmente incluindo as comunidades locais. Isto envolve não somente a pesquisa transdisciplinar, mas o reconhecimento de ambientes de pesquisa heterogêneos e híbridos e questões de gerenciamento social, ou como o público se envolve e responde à ciência. Este paper se extende em perguntas por longo tempo debatidas em pesquisas de ação participante, notavelmente aquelas relativas a como as comunidades locais e os indivíduos afetados podem alcançar e processar o conhecimento científico dentro dos debates contemporâneos sobre o clima, sustentabilidade e justiça social, ou a “fricção da ciência.” Este paper conclui com uma síntese de iniciativas atuais no corredor protegido do Xingu, a maior preservação indígena e ecológica do globo.

  

Arqueo-etnografia de Tierradentro

Prof. Dr. Cristobal Gnecco

Universidad del Cauca


Os Lugares da Memória na T.I. dos Asurini do Xingu

 Prof.ª Dr.ª Fabíola Andréa da Silva

Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE/USP)

Em 1982 Binford escreveu um artigo intitulado “The Archaeology of Place” onde ele estabelece parâmetros para a análise dos sítios arqueológicos como lugares de atividades humanas cuja configuração e variabilidade seriam resultantes: 1) da disponibilidade e distribuição dos recursos na paisagem; 2) dos padrões de mobilidade das populações que ocupassem estes lugares; 3) do tipo de uso (p.ex. residencial, acampamento, matança, armazenagem, oficina, observação) a que estes lugares teriam sido sujeitos ao longo do tempo. De lá para cá, a chamada “arqueologia do lugar” mudou e vários autores têm se dedicado a estudar os lugares, assim como as paisagens, em termos de suas temporalidades, biografias, significados (metafóricos, metonímicos), políticas, lógicas, redes, transformações e persistências. Eles são adjetivados como sagrados, perigosos, tradicionais, culturais, etc. Esta “nova Arqueologia do Lugar” procura entender o modo como as pessoas comunicam significado – tanto simbolicamente como através da ação – ao seu entorno físico e cultural e quais as formas materiais que estes significados adquirem. Neste trabalho quero contribuir para esta agenda de pesquisa, apresentando uma reflexão sobre o modo como os Asurini do Xingu apreendem o seu território que hoje se constitui na Terra Indígena Kuatinemu e como eles atribuem significados a determinados lugares, ou ainda, como os vestígios materiais (arqueológicos e históricos) e a paisagem são por eles articulados na constituição de lugares da memória.

 

Arqueologia e Saberes Locais: a construção da multivocalidade em Santa Catarina

Dr.ª Juliana Salles Machado

Museu de Arqueologia e Etnologia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral (MARquE/UFSC) 

Prof. Dr. Lucas Bueno

Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)


2.Memória, laudos antropológico-arqueológicos e delimitação de terras indígena

Este tema trata do papel dos arqueólogos e da arqueologia na realização de laudos antropológicos e arqueológicos e sua consequente relação com a delimitação de terras indígenas.

Palestras:


“O Santuário dos Pajés não se move!”: uma terra indígena em plena capital federal?

Prof. Dr. Jorge Eremites de Oliveira

Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD)


Tataypyrupa

Dr.ª Maria Dorothea Post Darella

Museu de Arqueologia e Etnologia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral (MARquE/UFSC)


Cosmológica mbyá-guarani: discutindo territorialidades

Prof. Dr. Sergio Baptista da Silva

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)


Arqueologia, Etnoarqueologia e História indígena em situações de conflitos nas Terras Indígenas Kayabi, Cinta Larga e Arara no Estado de Mato Grosso

Me. Francisco Forte Stuchi

Scientia Consultoria

A presente comunicação objetiva apresentar estudos de caso de pesquisas arqueológicas, etnoarqueológicas e de história indígena desenvolvidas na T.I. Kayabi, em processo de demarcação a 20 anos no baixo curso do rio Teles Pires (MT/PA),e nas T.Is. Aripuanã (Cinta Larga) e Arara do rio Branco (Arara), noroeste do Estado de Mato Grosso. Evidencia-se na atualidade que a trajetória histórica de tais povos e seus territórios, a tempos permeada por conflitos e perdas, tem seus problemas, ainda não resolvidos, sendo agravados pelos impactos socioambientais dos grandes empreendimentos hidrelétricos. Reféns da tutela do Estado/FUNAI e seus planos de governo desenvolvimentistas, tais povos tem se voltado ao que denominamos “patrimônios culturais” como forma de resistência e luta por direitos garantidos, mas não aplicados e em vias de desregulamentação. Dentro deste contexto, se faz necessário e urgente desenvolvermos reflexões sobre a prática e resultados das pesquisas arqueológicas e etnoarqueológicas em Terras Indígenas e seus entornos, que na prática é sopesada por uma herança desastrosa e demanda esforços redobrados para além requisitos legais mínimos como os de licenciamentos.


3.Narrativas plurais: a (re) construção do significado dos objetos em Museus

Este eixo temático visa trazer a discussão sobre o papel dos objetos em museus, refletindo sobre as construções e reconstruções de seus significados a partir do contexto da aldeia e das exposições e acervos.

Palestrantes: Presença de todos os convidados e dos acadêmicos indígenas do curso de licenciatura intercultural indígena da UFSC.


4.Território e Territorialidades

Este eixo temático trata a questão do território de maneira a abarcar tanto a construção e percepção de pertencimento de um sujeito à terra e à paisagem, quanto sua construção e vinculação política, como por exemplo, na demarcação de terras indígenas.

Palestrantes


Trilhando o Caminho das Águas: Aspectos da Territorialidade Guarani na Região do Lago Guaíba, RS

Prof. Dr. Adriana Schmidt Dias

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)

Nosso objetivo é discutir os resultados dos levantamentos arqueológicos realizados entre 2009 e 2010 no âmbito do Plano Operacional para a Identificação e Delimitação de Terras Indígenas nas Regiões Sul do Lago Guaíba e Norte da Laguna dos Patos, RS. Este projeto tinha por objetivo compreender a pertinência das localidades de Itapuã, Morro do Coco e Ponta da Formiga, região metropolitana de Porto Alegre, enquanto áreas de uso tradicional no complexo multi-local que caracteriza a ocupação Mbyá-guarani atual no sul e no sudeste do Brasil, visando produzir relatórios de identificação a fim de regularizar terras indígenas. Como resultado destas pesquisas foi possível registrar a presença na região do Lago Guaíba de 37 sítios arqueológicos da Tradição Guarani, dentre os quais dois apresentam datações entre 610 e 440 anos AP. A distribuição dos sítios revela uma rica rede de assentamentos pré-coloniais que interligava o Delta do Jacuí com os pontais e ilhas do Lago Guaíba, estendendo-se até a desembocadura com a Laguna dos Patos. A distribuição dos sítios na paisagem indica um padrão de dispersão regular, privilegiando determinados locais estrategicamente posicionados em relação ao sistema de ventos, sinalizando a importância dos deslocamentos aquáticos neste território. Observa-se também que as ocupações guarani pré-coloniais conformam um horizonte sócio-cultural e ambiental que atualmente continua sendo palco da territorialidade mbyá-guarani através da presença de inúmeras aldeias e acampamentos nesta área. Assim como se configuram no presente os assentamentos Mbyá na área, podemos pensar as ocupações pré-coloniais do Guaíba enquanto “ilhas” articuladas por um complexo sistema sócio-cosmológico, compartilhando os recursos do território e conectando-se entre si através dos “caminhos das águas”.


Paisagem, território e etno-história na Terra Indígena Lalima, Miranda/MS: um estudo etnoarqueológico dos lugares significativos

Me. Eduardo Bespalez

Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE/USP)

Desde quando tive as primeiras oportunidades de demonstrar meu interesse em pesquisar arqueologia na Terra Indígena Lalima aos índios que a constituem, muitos identificaram pesquisa arqueológica com etno-história e territorialidade. Um deles, chamado Manoel de Souza Neto, escolhido pelas lideranças indígenas para auxiliar as atividades de pesquisa, logo se mostrou um profundo conhecedor da paisagem cultural e do território tradicional, nos levando até as “taperas” que foram ocupadas no começo e, simultaneamente, nos contando a sua história de Lalima – focada no papel dos índios Guaikuru na trajetória de formação territorial e nos prejuízos causados pelo colonialismo e pela territorialização. Além das ruínas das antigas moradias, o Sr. Manoel também pôs ênfase numa rede de lugares dispostos na paisagem, tais como marcos territoriais, recursos naturais e locais cheios de significados culturais, situados tanto dentro quanto fora dos limites territoriais registrados pela FUNAI. Com efeito, Lalima, localizada na margem direita do alto curso do rio Miranda, é mais uma das reservas indígenas superpovoadas e territorialmente limitadas características do contexto etnográfico na região de Miranda, no Pantanal em Mato Grosso do Sul, sendo 1.400 índios Guaikuru, Terena, Kinikinau e Laiana, entre outros, vivendo em apenas 3 mil hectares. Assim, a presente comunicação tem o objetivo de apresentar os resultados iniciais de um estudo etnoarqueológico dos lugares significativos em termos etno-históricos e territoriais, os quais, entendidos enquanto expressões de identidade, memória e territorialidade, “é a prova” da legitimidade das reivindicações indígenas, ou seja, que a reclamação territorial “num é diz que”.


Territórios em disputa: o papel da pesquisa etnoarqueológica nos estudos de identificação e delimitação das Terras Indígenas Guarani Ñandeva no sudeste do estado de São Paulo

Dr. Robson Antonio Rodrigues

Fundação Araporã – CEIMAM/UNESP

 A presença e a história dos Guarani integram a construção da realidade sociocultural do Estado de São Paulo, do Brasil e da América do Sul. O povo Guarani conhece perfeitamente a localização de suas áreas territoriais, estejam elas no Brasil ou em outro país. Além disso, o domínio dos Guarani sobre o seu território é anterior à divisão do mesmo efetuada entre portugueses e espanhóis. No contexto histórico da região sudeste paulista estas terras pertenciam às populações indígenas existentes na região e que, posteriormente, foram transferidas para a Terra Indígena Araribá, município de Avaí, região de Bauru, centro oeste do estado, local da criação de um dos primeiros aldeamentos oficiais do SPI. Historicamente, o próprio deslocamento Guarani pelo seu Território demonstra que eles são da região estudada e que não chegaram por acaso ao local. As migrações aconteciam anteriormente à chegada dos europeus, constituindo-se em aspectos próprios da cultura Guarani, e que, no decorrer do processo histórico este movimento se transmutou devido a anos de contato com o não-indígena. Através de sua organização política, por sua vez, passaram a lutar pela manutenção de sua identidade e retomada de seus territórios, em geral usurpados pelos não-indígenas e, muitas vezes, regularizados pelos Governos, em um franco desrespeito a imemorialidade desses povos quanto ao seu direito originário às terras indígenas que lhes são necessárias para sua sobrevivência física e cultural à qual têm direito conforme artigo 231, da Constituição Federal de 1988. Para fazer valer este artigo da CF/1988, em 2005, os Guarani Ñhandeva deslocaram-se da Terra indígena Araribá para os municípios de Itaporanga e Barão de Antonina no intuito de retomar parte de seu antigo território. Entender aspectos da dinâmica de ocupação Guarani Ñandeva no contexto do vale do rio Itararé, além de informações sobre o grupo no que diz respeito a dados históricos sobre a ocupação das terras indígenas, tendo em vista os aspectos culturais, espaciais e temporais é o que se pretende desenvolver.


Manuel Souza Neto

Representante Guakuru


Local

As atividades serão realizadas no Auditório e no Pavilhão de Exposições Sílvio Coelho dos Santos do Museu de Arqueologia e Etnologia Professor Oswaldo Rodrigues Cabral (MARquE/UFSC), situado no Campus Universitário Reitor João David Ferreira Lima, bairro Trindade, em Florianópolis/SC.